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Laboratórios de desenvolvimento: o que você precisa saber?

O que você ganha participando de laboratórios de desenvolvimento? Conversamos com a roteirista e diretora Joyce Prado para entender o valor desses processos para a obra e a carreira artística


Cerimônia de entrega dos prêmios no Brasil Cinemundi (2019) - Imagem: CineBH International Film Festival

Com tantos desafios entre o roteiro e a produção, roteiristas brasileiros buscam alguns caminhos para viabilizar seus projetos e encontrar destaque no mercado: concursos, festivais, rodadas de negócio, contatos direto com produtoras, etc.


Embora válidos, esses caminhos são voltados para quem já tem em mãos um projeto pronto, lapidado e maduro o suficiente para melhor representar a perícia técnica e visão artística do roteirista em questão.


O que fazer quando seu projeto ainda não chegou nesse patamar? É justamente para encontrar narrativas interessantes e lapidar projetos promissores que existe o espaço imersivo do laboratório de desenvolvimento.


Você está desenvolvendo um roteiro ou argumento e quer contar com o olhar crítico de profissionais muito bem inseridos no mercado? Esse é o caminho ideal para trilhar! No exterior, laboratórios de desenvolvimento de renome servem de porta de entrada para a carreira de muitos roteiristas, como o Sundance Screenwriters Lab, Torino Film Lab , Film Independent Screenwriting Lab, entre tantos outros.


Aqui no Brasil, iniciativas como o Laboratório Novas Histórias, BrLab e o Sesc Argumenta já são responsáveis por impulsionar grandes projetos no mercado. Cada laboratório tem seu foco, seja no processo de imersão na trama, em proporcionar um espaço de troca com produtores e investidores em potencial ou mesmo na elaboração do pitching. Sendo assim, é importante entender quais laboratórios atendem aos seus objetivos e como aproveitar o melhor de cada um deles.


Para falar sobre esse importante tema, convidamos a roteirista, diretora e produtora executiva Joyce Prado. Fundadora da Oxalá Produções, Joyce assina o longa-metragem documental "Chico Rei Entre Nós" (Abrolhos Filmes), que será lançado em breve.


Um pouco da carreira de Joyce Prado


Imagem: WME Awards

Com graduação em Rádio e TV e pós em roteiro pelo SENAC, Joyce começou sua carreira na pesquisa de imagem para comerciais e filmes. Além de ampliar seu repertório, a experiência proporcionou a ela um espaço para exercitar a noção imagética dos roteiros.


Depois de experiências com assistência de produção, aproximou-se do diretor Chico Toledo e realizou a direção de produção e roteiro do curta "Muros Entre Nós". Segundo Prado, isso trouxe uma maior noção de mercado, orçamento, equipamentos e cachês, conhecimentos que seriam muito úteis depois, ao abrir sua própria produtora.


Sua primeira experiência na direção foi com o projeto "Fábula de Vó Ita", curta-metragem que mistura live-action com animação e traz elementos fantásticos para abordar a discriminação. Segundo ela, essa "provocação inicial deu voz à problematização do racismo e falta de representatividade negra no cinema".


Joyce Prado e Bruno Ribeiro em entrega de prêmios no Brasil Cinemundi - Imagem: CineBH International Film Festival

Fundou a Oxalá Produções e, lá, começou a trabalhar com diversos ramos da cultura. Em 2018, firma parceria com o diretor Bruno Ribeiro e, juntos, realizam o desenvolvimento do longa "Sião". O filme participou de labs importantes, como BrLab e TorinoLab, além de ser premiado no Projeto Paradiso.


Nesse meio tempo, Joyce recebe a proposta de dirigir o longa documental "Chico Rei Entre nós", que participou do New Directors/New Films Festival em Portugal. Além de tudo isso, Joyce Prado vêm prestando consultoria de projetos para admissão em laboratórios.


Os laboratórios de desenvolvimento e a carreira do filme


Imagem: podview.com.br

"Eu penso que os laboratórios nos trazem muita provocação, como realizadora ou produtora executiva. Já tive em laboratório como esses dois papeis", revela Prado. A autora reforça que frequentar labs de desenvolvimento ajuda a "não ter receio de dizer o real estágio do projeto".


Assim, compreendemos que existem laboratórios ideais para cada projeto e seu estágio no mercado. Joyce complementa a questão através da sua própria experiência:


"O BrLab, por exemplo, procura projetos mais estabelecidos e conscientes em termos de produção. Além disso, somos provocados a pensar em diferentes propostas de orçamento, visando diferentes perfis de coprodução e financiamento". - Joyce Prado

Prado afirma que o BrLab trouxe um "outro universo de possibilidades de diálogos com produtores internacionais", onde ficou clara a importância de participar de eventos do tipo. É uma forma construtiva de iniciar a carreira do filme.


"Seja nacional ou internacionalmente, o filme começa a estar presente em catálogos de diferentes laboratórios que são normalmente vinculados a festivais, onde começa a agregar valor e consequentemente despertar o interesse de financiamento público ou privado", resume.


Sendo assim, podemos entender os laboratórios como espaços não apenas de reflexão, mas também onde o filme "passa a existir" no mercado de alguma forma. Outros labs, cientes disso, oferecem ferramentas para produção e financiamento das obras.


Joyce relembra sua experiência no Torino Film Lab para apresentar este ponto: "no Torino Lab, a questão é ter acesso à diversas formas de financiar, produzir e desenhar a audiência. A partir daí, o projeto começa a desenhar sua produção, distribuição e acesso ao público".


Produção, estratégia de destribuição e desenho de audiência são grandes desafios para o realizador independente. Contar com um selo internacional e especialistas de prestígio nas diferentes áreas da produção pode impulsionar um projeto que, sem isso, talvez acabasse encontrando maiores obstáculos no caminho.


Para quem está em um ponto mais avançado do processo, há opções de laboratório que prometem um "empurrão final". Prado comenta: "o Cinemundi tem uma dinâmica mais de mercado, para projetos mais consolidados".


O Brasil Cinemundi, que faz parte do Festival Internacional CineBH, promove painéis, debates, consultoria para os projetos selecionados e encontros com representantes do mercado. Em 2019, o projeto "Sião", com direção de Bruno Ribeiro e produzido por Joyce Prado, foi o grande vencedor da edição.


Joyce afirma que o Cinemundi proporcionou um contato maior com players europeus e uma visibilidade maior para o seu projeto, onde ela conseguiu apresentar "de maneira sincera os desafios de financiamento e produção do longa".


É de se esperar que eventos como esse acabem formando um circuito de reencontro com produtores, diretores e outros roteiristas. Isso, é claro, além de trabalhar os pontos de atenção de cada projeto e técnicas de apresentação.


Hoje, a partir da experiência dos laboratórios, quando vou para a redação do projeto como produtora executiva, eu já entendo que esse é o seu primeiro pitching. Para um financiamento, para um edital, é o seu primeiro pitching, porque ali você precisa defender a relevância, a potência, apresentar um orçamento, cronograma e o porquê de você estar inscrevendo nesse edital, dentro da trajetória do projeto".- Joyce Prado

Foi esse o caso do New Directors/New Films Pitching Forum, onde Joyce relata que aprendeu muito sobre "postura e passo a passo da apresentação do pitching".


A formação crítica e o feedback especializado


Imagem: Hot Docs

Quem constrói sua carreira como roteirista, sabe muito bem da importância do feedback construtivo. Se esse feedback vier de consultores de prestígio no mercado audiovisual, o resultado para o roteirista é ainda melhor!


De primeira, já entendemos o valor de ingressar em um laboratório de desenvolvimento: contar com um olhar crítico, especializado, capaz de orientar o autor para um possível caminho para a sua obra (artístico ou mesmo de mercado).


“O que é muito bom no BrLab é que eles pensam os consultores que melhor se relacionam com o seu projeto. Então são consultores que eles acreditam que têm uma linguagem e estética que pode colaborar com o desenvolvimento do projeto”, comenta Prado.


“Você consegue, em uma semana, mapear de uma forma muito técnica e objetiva quais são as fragilidades atuais do desenvolvimento do roteiro. Se são as personagens, quais são as personagens. Se é o arco narrativo, qual é o momento do arco narrativo. Se tem ausências, quais são as ausências”. - Joyce Prado

Você conhece as principais fraquezas do seu roteiro? O profissional que trabalha sozinho dificilmente tem o distanciamento necessário para compreender essas questões e descobrir formas inventivas de solucionar problemas na trama.


Em relação a esse ponto, Joyce Prado complementa: “eu sinto que os laboratórios de desenvolvimento vão te dando essa ferramenta para você conseguir, também, ser mais crítico com o seu projeto, permitir a parte criativa, mas conseguir entender o que está faltando”.


Repensando os alicerces


Imagem: Sundance Institute

Relembrando sua passagem pelo New Directors/New Films (com o projeto em finalização "Chico Rei Entre Nós"), Joyce traz um ponto muito relevante para refletirmos sobre o caráter cíclico da criação:


"A gente tinha encontros das 10 às 18 horas. Entre esses encontros, precisávamos responder a perguntas sobre o que é o filme, a razão dele existir e o que é universal nesse filme. Tem esse caráter de encontrar a universalidade do filme na maior parte dos eventos de desenvolvimento de roteiro justamente porque o principal desejo das produtoras é que eles viagem para além do Brasil". - Joyce Prado

De acordo com a autora: "ter essas perguntas realizadas cotidianamente por quatro dias ao longo do processo de edição do filme foi muito importante, pois eu fui conseguindo reencontrar qual era a premissa e qual era o objetivo final, para onde eu queria conduzir o espectador".


Joyce fala sobre o processo de reencontrar suas premissas e objetivos de forma constante, o que ela chama de “o exercício da busca”. Você pode repensar até os pontos mais fundamentais da sua obra continuamente, faz parte do processo de criação.


Independente do filtro específico, se existe um ponto de intersecção entre todos esses eventos que se apresentam como laboratórios de projetos, esse ponto é: proporcionar um ambiente para você, autor, reavaliar todos os alicerces do seu projeto.


As passagens em laboratórios e os impactos para a carreira


Laboratórios de desenvolvimento ajudam na construção artística e mercadológica do seu projeto, mas o que acontece depois que você participa de uma experiência dessas? Será que essa é uma maneira prática de trilhar um caminho de sucesso no mercado?


Joyce Prado afirma que sim: "dentro do mercado brasileiro a gente tem, cada vez mais, valorizado roteiristas com histórico de laboratório". Segundo ela, com essa passagem "o fato do projeto ser selecionado entre um universo de 300 a 400 outros projetos já traz uma notoriedade para esse roteirista".


"Quando você apresenta o seu currículo para um potencial produtor e ali já está uma lista de laboratórios em desenvolvimento, enquanto produtora executiva isso já me traz mais interesse". - Joyce Prado

Posteriormente, esses projetos que se destacam em um laboratório provavelmente vão despertar interesse em rodadas de negócios. Afinal, o projeto já existe, deu seus primeiros passos e ganhou um primeiro "selo" do mercado.


Com tantos roteiros circulando, essa é uma forma de mostrar que o seu projeto tem elementos de destaque. Mesmo assim, Joyce dá um recado final sobre a escolha do caminho certo para o seu roteiro: "dialogue com pessoas que já participaram desses laboratórios para não criar uma outra expectativa".


Como sempre, nosso conselho é: estude o evento, mas também o grupo de consultores/participantes. Compare essas informações com o estágio atual do seu projeto e entenda se vale a pena participar daquele laboratório naquele específico momento.


Com tudo isso em mente, participar de um laboratório de desenvolvimento tem tudo para ser uma das experiências mais enriquecedoras na carreira de um roteirista.


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