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A personagem através do diálogo: a ação verbal em “O Lobo Atrás da Porta”

Lucas Andries e Kethleen Formigon analisam a construção das personagens principais através de sua expressão verbal

O Lobo Atrás da Porta
"O Lobo Atrás da Porta". Imagem: GZH

Este artigo foi originalmente publicado no livro "Roteiro X: The X Script" (2020) - DAVINO, Glaucia e BELLICIERI, Fernanda (orgs).



A partir do lançamento e do sucesso de público do “talkie” “O Cantor de Jazz” (1927), o cinema passou a também compreender dentro de sua banda sonora o diálogo falado. Tal fato não só alterou a maneira como os filmes eram consumidos, como modificou também o processo de produção cinematográfica como um todo. Nada podia fazer barulho dentro do set: o diretor não podia dirigir como dirigia, falando durante as gravações; equipamentos de luz barulhentos tiveram de ser repensados; atores e atrizes cujas vozes eram consideradas como ruins estavam fora; até a câmera teve de ser colocada dentro de uma “caixa” – ou blimp – para não atrapalhar.


O processo de se pensar um roteiro de ficção para o cinema não ficou para trás e teve que ser alterado – ele teria de contar agora com a comunicação verbal por meio da linguagem oral. Havia, então, a possibilidade de as histórias serem agora contadas, ditas. Com o tempo e com a evolução das narrativas, o diálogo tornou-se um dos muitos meios de se fazer progredir a história e de aprofundar seu desenvolvimento.


Como afirma Robert McKee, o diálogo pode ser – em um nível superficial – dividido em texto e subtexto. O texto corresponde ao que é de fato dito, ao passo que o subtexto é o que há por baixo dessa superfície. Essa camada mais profunda de informação proporciona um melhor desenvolvimento das personagens, a maior nitidez desses seres ficcionais para o espectador e, consequentemente, um maior nível de empatia é estabelecido entre personagem e público.


O diálogo ganha, desse modo, meios de se tornar um campo de prática e estudo quase à parte dentro da roteirização de ficção para produtos audiovisuais.


Busca-se com este artigo perceber como se dá a construção desses seres ficcionais a partir de sua expressão verbal, de sua ação verbal. Entender, ademais, como o diálogo é utilizado com fins não apenas expositivos, mas também de desenvolvimento – dentro e fora da estrutura fílmica – de personagem. Para isso, o longa- -metragem brasileiro “O Lobo Atrás da Porta” (2013), de Fernando Coimbra, foi escolhido para análise, uma vez que toda sua narrativa é baseada na elucubração das personagens e na tentativa do público em compreender o porquê de as protagonistas tomarem as atitudes que tomam. O filme, além disso, faz parte de uma nova e importante fase do cinema nacional.


*As imagens do roteiro presentes no artigo são transcrições do filme, já que o roteiro não foi disponibilizado ao público.


O filme e as personagens

O Lobo Atrás da Porta
"O Lobo Atrás da Porta". Imagem: Revista Cinética

“O Lobo Atrás da Porta” (2013), longa-metragem escrito e dirigido por Fernando Coimbra, narra a história de dois amantes, Bernardo e Rosa. Quando Clarinha, a filha de Bernardo com sua esposa – Sylvia –, é sequestrada da escola em que estuda, uma investigação é iniciada pela polícia. Assim, Bernardo, Sylvia e Rosa são interrogados pelo Delegado. Os depoimentos dos três passam, então, a tecer a trama de amor passional dos amantes.


Descobre-se, através de flashbacks, toda a trama anterior: Bernardo, descontente com seu casamento, conhece Rosa e eles começam a “namorar”. Rosa não fazia ideia de que o homem era casado. O relacionamento começa a durar e Bernardo tenta equilibrar as duas mulheres, mantendo-as sem que uma tenha conhecimento da outra.